Capítulo 9, Marcas.

9
Tomei um banho cantando, feliz da vida. Me enxuguei, e dei uma secada no cabelo só pra ele não pingar, mas fiquei com os cabelos ainda molhados. Pus um shorts mais básico e minha camiseta da Skillet. E nem me importei com a maquiagem, estava na hora de Victor me conhecer sem ela. Calcei meus chinelos de dedo bem a vontade. Ouvi o barulho do portão abrir, peguei os presentes e esperei os dois ao lado da porta. A porta se abriu...
   -Surpresa! Feliz aniversário pirralho!
   Dei um abraço nele, ele me agradeceu com sorriso largo, daqueles que fazem a vida valer a pena e pôs-se a abrir os pacotes. Primeiro abriu o maior que era o do carrinho.
   -Nossa mana! Que carro incrível, obrigado!
   “Ainda bem que eu confiei no gosto do Victor”, pensei aliviada. John foi abrir o outro pacote.
   -Palhetas? – Ele disse com um rosto que mostrava uma mescla de curiosidade com decepção.
   -São pra acompanhar seu outro presente, - Minha mãe disse vindo em direção à ele com o violão. – feliz aniversário meu homenzinho!
   -Ai mãe eu não acredito! Meu violão... Muito obrigado, mesmo! Ele é lindo.
   Fiquei muito feliz ao ver o brilho nos olhos do meu irmão. Aquele brilho nos olhos de uma menina de oito anos ao entrar em uma loja de música e observar as baterias acústicas.
   -Ah e tem mais um presente. Hoje à noite você já vai ter a sua primeira aula.
   -Ah é? E quem vai me dar aulas?
   -O namorado da Natalie.
   -Mãe! Ele não é meu namorado. – Olhei pra ela séria. Voltei-me a John. -  John o Victor vai te dar aulas, um amigo meu, aquele do portão. Ele toca muito bem e vai te ensinar tudo direitinho.
   -Ah sim, aquele que te beijou e que você nega que ele seja o seu namorado, claro. Mas muito obrigado mesmo mãe, e mana por tudo, amo vocês.
   -A gente também te ama pirralho. – Demos um abraço em conjunto. Minha família podia ser pequena, mas sem dúvida era a melhor que eu poderia ter.
   Sentamos no sofá da sala, eu e John pra assistir seriados. Mamãe foi pra cozinha preparar pizzas pra comermos depois da aula de John. Depois de um tempo a campainha tocou. Eu fui correndo abrir o portão. Dessa vez ele estava vestido mais a vontade. Estava de camiseta azul escura, uma calça jeans básica e um all star branco, o mesmo que usava na primeira vez que o vi. Mas como sempre estava lindo com seus cabelos ligeiramente bagunçados e seus olhos azuis mais intensos do que nunca. Ele trazia nas costas a capa de um violão, com um dentro é claro.
   -Oi minha princesa. – No portão ele me deu um selinho, e me olhou dos pés a cabeça novamente me causando calafrios. – Você fica linda assim.
   -Assim como?
   -Com cabelo molhado, sem maquiagem. Você é linda de qualquer jeito. Mas você fica muito linda assim.
   -Ai Victor, deixa de ser bobo. Vamos entrar, John está te esperando e minha mãe está fazendo pizza pra nós comermos depois.
   -Hum, pizza que delícia.
   -Pois é, já está querendo te agradar.
   -Como eu já havia dito, eu conquisto as mães.
   -Claro.
   Ele passou do portão e foi comigo em direção a casa.
   -Mãe, Victor chegou!
   Minha mãe saiu da cozinha com os cabelos presos e um avental, e veio até a sala cumprimentar Victor, com um sorriso sincero, típico da minha mãe. Ela era assim, se gostava de uma pessoa, era simpática e amável, mas se não gostasse não fazia questão nenhuma de que a pessoa pensasse o contrário.
   -Oi Victor, fique à vontade, nossa casa é simples, mas sinta-se em casa.
  Ela o cumprimentou com um beijo no rosto, tipo, beijo de comadre, onde na verdade o que se encosta são as bochechas.
   -Muito obrigado senhora Lewis.
   -Pode me chamar de Lindsay rapaz.
   -Tudo bem Lindsay. – Ele falou sorrindo meio sem jeito, e eu contemplando aquela maravilhosa cena. - Mas onde está o meu aluno?
   John se aproximou com um sorriso enorme.
   -Estou aqui.
   -Prazer cara, - Victor disse cumprimentando-o com aqueles cumprimentos de garoto. – Sou Victor, seu novo mais novo professor de música.
   -Prazer Victor, me chamo John.
   -Então John, vamos começar?
   -Claro cara, vamos lá no meu quarto e deixar as meninas tricotando aí.
   -Claro, claro. – Victor disse, fazendo parecer uma conversa com um amigo da sua idade.
   Eles entraram no quarto e deixaram a porta aberta. Eu e minha mãe fomos pra cozinha, mas dava de ouvir a voz de Victor explicando a parte teórica da música pro John. Eles pareciam estar se divertindo, ouvia risadas vez ou outra, Victor parecia explicar muito bem. Pude ouvir ele dizer à John algumas coisas como: “ A música é mais do que um barulho que tenha sentido. Ela é a melodia da alma, e é da alma que ela tem que sair.”
   Fui até o banheiro e aproveitei pra dar uma espiadela nos dois. Victor sorria, parecia realizado e satisfeito. John parecia empenhado em aprender, mas também com um sorriso estampado no rosto. Quando voltei do banheiro, olhei novamente, dessa vez, Victor me notou. Ele me olhou, sorriu e deu uma piscadela, eu apenas sorri, e passei para a cozinha. Me sentei em uma cadeira, e mamãe estava pondo as pizzas para assar.
   -Victor é mesmo um ótimo rapaz.
   -É, ele é mãe.
   -E vocês pretendem assumir o namoro quando?
   -Calma mãe, é cedo ainda.
   -Claro, claro.
   Ela se sentou ao meu lado.
   -Vocês estão tão apaixonados que dá pra qualquer um ver.
   -É tão visível assim?- Fiquei um tanto quanto assustada.
   -Aham.
   -Mãe, eu me sinto tão bem com ele. – Acho que estava mais do que na hora de sincera com a minha mãe.
   -Você vai acabar casando com esse rapaz.
   -Anna disse o mesmo. – Eu ri na tentativa de me imaginar casada. Estranho.
   Uma hora se passou, e os garotos vieram até a cozinha. Victor parou na porta sorrindo todo orgulhoso, enquanto John não conteve a sua alegria.
   -Mãe! Eu aprendi um monte de coisas com o Victor! Sei ler cifras e até já sei fazer alguns acordes!
   -Nossa filho, que ótimo! – Ela olhou pro Victor. – E o John é bom aluno professor?
   -Muito bom aluno, rapidinho ele já vai estar craque nisso.
   -Ouviu mãe? Aí eu vou tocar várias músicas pra você! – Seu brilho nos olhos me enchia de alegria, era tão bom ver John daquele jeito.
   -Com certeza, e eu vou cobrar hein? Mas então, vamos sentar pra comer? As pizzas já estão prontas. Victor fique a vontade pode sentar.
   -Se não for incomodar. – Victor parecia ainda mais sem jeito. Precisava dar os parabéns pra minha mãe, porque ela parecia ser a única a conseguir deixar Victor assim.
   -Claro que não rapaz, pode se sentar.
  Sentamos à mesa, eu estava meio tensa, sei lá, meu futuro namorado jantando na minha casa, que estranho. E se ele não gostar de alguma coisa? E se a minha mãe acabar desgostando dele? Ele estava totalmente tranquilo novamente, bem típico do seu gênio. Mamãe sentou na ponta, John à sua esquerda, eu à sua direita e Victor ao meu lado. Nos servimos e comemos. Victor elogiou a comida, e minha mãe ficou toda orgulhosa. Ele fez todo mundo da mesa rir com o seu senso de humor apurado. Conversamos muito, rimos muito e minha tensão desapareceu totalmente. Depois disso John foi olhar tevê e a minha mãe foi junto. Victor me indagou;
   -Onde é o seu quarto?
   -É do lado esquerdo do quarto do John.
   -Posso ir lá ver como é?
   -Claro.
   Levei Victor até o meu quarto tranquila porque sabia que ele estava arrumado. Deixei a porta aberta, só pra mamãe não pensar besteira. Sabe como é que é né?
   -Amei seu quarto, muito estiloso, bem de acordo com a sua personalidade.
   -Obrigado. – Eu gostava mesmo do meu quarto, ele era meu mundinho. Me sentia totalmente livre. Personalizei ele com tudo o que eu mais gostava.
   Ele parou e ficou olhando a parede de pôsteres atrás da minha bateria. Tinha um pôster grandão da Skillet, um menor da bandeira americana, um do ator Johnny Depp, um com o letreiro dos Beatles, e um com a foto da Jen Ledger  (minha baterista favorita) segurando suas baquetas. Logo depois ele foi para o meu mural de fotos, cuidando cada detalhe. Tinha fotos minhas com meu pai, com minha mãe, com o John, com a Anna, com a Liza, com meus amigos da escola.
   -Está faltando uma foto minha aqui. – Ele falou meio frustrado, sabendo que entre os meus amigos da escola na foto estava o Daniel.
   -Temos que tirar uma juntos.
   -Sim, temos, aí tu vai por bem no meio do teu mural.
   -Claro, e ainda vou escrever; “meu feioso”. – Falei descontraindo.
   -Promessa?
   -Promessa.
   -Então está ok.
   Ele observou a prateleira cheia de livros, a maioria títulos de Nicholas Sparks, alguns de Meg Cabot, outros da Cecília Meireles, Martha Medeiros. Também tinha clássicos como “O menino do pijama listrado”, “A menina que roubava livros”, enfim.
   -Você gosta mesmo do Nicholas Sparks.
   -Sou apaixonada pelos livros dele. E você, que livros gosta de ler?
   -Gosto muito dos livros de Stephen King, e  Sidney Sheldon.
   -Já li alguns livros deles, são bons.
   Ele apenas sorriu consentindo. Então chegou nas prateleiras cheias de bichinhos de pelúcia.
   -É, a garota que gosta de preto e vermelho, tem uma prateleira cheia de bichinhos de pelúcia, isso me parece com uma menininha doce e frágil.
   -Vou te confessar que amo bichinhos de pelúcia. Mas sim, eu tenho esse lado que eu não gosto muito de mostrar.
   -Você é perfeita sabia? – Ele sorriu, se aproximando de mim. - E eu estou aqui pra cuidar dessa menininha frágil.
   -Eu não sou perfeita. Muito pelo contrário.
   -É perfeita pra mim.
   -E você é perfeito pra mim.
   Nós dois sorrimos um para o outro, e ele me abraçou apertado do jeito que eu gosto, daquele jeito que parece que te esvazia de tudo que te entristece.  Ficamos assim, abraçados por um tempo.
   -Vamos lá pra sala?
   -Vamos.
   Sentamos um pouquinho no sofá. Mamãe e John estavam no sofá maior, eu e Victor sentamos no menor. De repente, John se vira pra Victor, surpreendendo a todos.
   -Cara, porque você não aproveita e abraça ela?
   Eu fiquei pasma com a atitude de John. - John!
   Victor apenas riu, sem jeito, e mamãe resolveu se manifestar.
   -É Victor, também acho que você devia fazer isso. Não se intimide não.
   -Mãe?! – Falei arregalando os olhos por sua atitude estranha.
   Mamãe riu, Victor também.
   -Então, se vocês me permitem. - Ele pôs o braço por cima das minhas costas, me abraçando.
   -Até que enfim né cara! E olha, você é gente boa. Tem minha permissão pra namorar minha irmã.
   -Valeu cara! – Victor disse agindo com naturalidade, me deixando um pouco encabulada, e estranhamente feliz.
   -Oi, eu ainda estou aqui, se é que não perceberam. – Falei ironicamente.
   Depois de um tempo conversando na sala, já eram 22h30 e Victor achou melhor ir embora.
   -Gente, muito obrigado pela janta, por tudo. A conversa estava ótima, mas eu tenho que ir embora
   -Fica mais um pouquinho. – Minha mãe havia gostado da companhia de Victor.
   -Desculpe senh... Digo, Lindsay, eu tenho mesmo que ir, obrigado.
   -Então tudo bem, fazer o que?
   Mamãe se despediu dele com o mesmo beijo de comadre e John com o mesmo cumprimento. Eu o levei até o portão.
   -É Victor, essa é a minha família.
   Ele riu. - Amei ela. Seu irmão é muito gente boa, não reclama mais dele.
   -É porque você não mora com ele. – Disse erguendo uma das sobrancelhas.
   -Pois é, mas ele foi muito parceiro comigo. – Ele parecia satisfeito. - Mas então Nat, tenho que ir nos falamos amanhã.
   -Tudo bem né.
   Dessa vez o beijo já não foi mais surpresa pra mim. Foi meio que, automático, foi como se tivesse algum tipo de imã entre nós.
   -Boa noite, sonha comigo.
   -Você também.
   Dito isso, ele saiu virou e foi embora e eu entrei em casa.
   -Mana, namoro autorizado.
   -Pirralho, menos.

   Pus um pijama, escovei os dentes e fui me deitar. Sorrindo e viajando eu altos pensamentos e sonhos de amor. Coisas que eu nunca pensei que passaria pela minha cabeça passaram. Eu amava Victor, era isso e ponto final.

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